segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O 1º dia de trabalho.

Caros leitores,
escrevo, hoje, por obrigação! Obrigação de quem tem amigos que lêm o blogue e que estão à espera de novidades. Obrigação de quem habituou os caros leitores a mensagens quase diárias desde o debut (pronto, lá vêm as mots francesas...) do "Relier à Paris".
Estou cansado após o esforço que foi concentrar-me para perceber e fazer-me entender em francês. Cansado por um dia de trabalho longo e algo laborioso. Cansado das 8 notas de alta (ainda que sucintas) que fiz...
E é este cansaço que não me deixa, neste momento, ser completamente feliz!
O dia, como devem imaginar, foi diferente de qualquer meu outro dia. Apresentei-me no Serviço às 8:30. Fui recebido pela Catherine, uma enfermeira Africana (ela assim o disse), muito simpática, e que tratou, de imediato, de me arranjar uma "blouse" pois que, médico que se preze tem de andar de bata! E, vejam só, com o frio que faz por estas paragens, de manga curta! Claro está que o Serviço é todo ele quentinho...
Um bocadinho mais tarde chegou a minha colega Búlgara, a Yana. Também ela impecável, um bocadinho stressada. Então, uma outra enfermeira fez-nos a apresentação a todo o Serviço. Já passava das 9h quando chegou o médico de residência, que só esteve até às 14h, e que foi o seu último dia no Serviço. Não sei quem, de séniores, ficará nos restantes dias da semana mas, a partir da próxima 4ª feira (dia 12) teremos, connosco, uma médica Italiana (sénior), também ela impecável. Quando lhe disse que vinha do Porto do Hospital Sto António, a 1ª coisa que ela perguntou foi porque diabos é que tinha ido parar a Beaujon, se trabalhava naquele hospital, no sentido de que, aparentemente, o meu Sto Antoninho é reconhecido além fronteiras, eh! Eh!
Bom, a manhã foi-se passando, tendo-me sentido um verdadeiro aluno do 3º ano de Medicina, que não conhece nada, não sabe como os "truc" (palavra óptima que aprendi e que significa "coisa" o que quer dizer, meus caros, que quando vierem a Paris e não souberem uma palavra ou objecto basta dizerem "ce truc lá!") se processam, enfim...
Só depois do almoço, e na vigência da falta de médico sénior, meti a 3ª, a 4ª, a 5ª e lá fui a alta velocidade tal e qual o meu gnomo de patins, desenrascando o que me aparecia pela frente. Até "baixas médicas" passei! (No essencial, é igual a Portugal, mas é para me armar um bocadinho...).
O almoço foi digno de ser filmado, e há coisas que dificilmente vos conseguirei transmitir, pois o meu estado de fluência de palavras está em baixo de forma.
Bom, às 13:15 lá fui eu e os meus restantes colegas internos almoçar à cantina exclusiva para médicos e farmacêuticos. Entramos em filinha indiana e eu, como um verdadeiro gentleman, fui atrás da malta toda quando, qual o meu espanto, vejo-nos a entrar numa sala, pequena por sinal, com uma mesa em "U", onde cabiam, talvez, umas 12 pessoas de cada lado, e reparo nos meus colegas da frente a "baterem ao de leve" com o dorso das mãos, as costas das várias pessoas que comiam. Já a mais de meio de semelhante espectáculo, perguntei à Sónia (a minha colega Tunisina, que ia à frente) que procedimento era aquele, ao que ela me respondeu que era uma espécie de cumprimento! Bom, o facto é que, depois de termos percorrido todo o U, retiramo-nos daquela sala e fomos para uma outra contígua com uma única mesa comprida, com lugares dos 2 lados. De cada lado da mesa havia lugar para, talvez, umas 15 pessoas. De prato ladeiro, faca e garfo, eis que começou a chegar a comida, passada em travessas, desde a minha direita, e num gesto repetido de colega para colega. Isto é, imaginem, os caros leitores, que tenho o colega 2 que está à minha frente e à direita, o colega 1 que está do meu lado direito, eu sou o número 3, o colega 4 é o que está mesmo à minha frente, o 5 é o do meu lado esquerdo e o 6 o que está à minha frente à esquerda. Pois que todas as travessas que passaram por mim, desde os legumes, o prato de massa, de atum, de carne, de batatas, de fruta, de iogurtes, vinham no sentido do 1 para o 2, do 2 para o 3, do 3 para o 4, do 4 para o 5 e assim adiante, em zigue-zague, e ai de quem trocasse o esquema da coisa!
O apogeu foi quando veio o iogurte. Caros leitores, como é que se come o iogurte numa cantina que é só para médicos e farmacêuticos num hospital de Paris? Toda a gente sabe que é com o CABO DO GARFO!!! Realmente nós, os Tugas, temos cá uma mania... Olha lá, utilizar uma colher para comer um iogurte... se tem jeito!
Bom, a tarde lá se passou, a fazer as notas de alta dos doentes que estiveram internados no hospital de dia, e saí do hospital perto das 19horas.

E foi assim o meu primeiro dia.
Balanço final: Gostei dos colegas, da equipa de trabalho e do ambiente, apesar de estar, e ainda continuar, num processo de integração que, naturalmente, vai demorar.

Bien à vous,
Fil

3 comentários:

Anónimo disse...

Bravo! Du courage, mon grand! Muito obrigada, meu querido sobrinho, tu sabes que vale o sacrifício, embora conteste a obrigação. Tu es libre d'écrire ou non, mas tu sais que tout le monde a un immense plaisir à te lire et à te relire. Et voilá!
Pergunto-me como é que conseguiste almoçar com tanta dinâmica e subsequente observação; agora vê se consegues pôr-nos a imaginar a dança que foi o tal almoço. Fiquei consada só de ler... foi até quantos?! E ficaste a conhecer mais uma valência do garfo! Obrigada por partilhares a tua ciência.
Continuation de bon travail!
Gros bisou et à bientôt.

Unknown disse...

O verdadeiro descanso do guerreiro!
Achei um piadão à cadência da refeição! Pela descrição parecia a refeição de uma família Von Trapp alargada! (Fora a parte do cabo da colher, como é óbvio, semelhante coisa nunca passaria pela cabeça de nenhuma família austríaca!)
Olha, meu caro, se o facto de, ao fim de um dia duro de trbalho, escreveres no teu blogue não te trouxer, mesmo que pouquinha, uma sensação de exorcisação desse cansaço, de uma libertação tranquila que te faz adormecer com um sorriso nos lábios... então, como diz la tante, contesto com veemência a obrigação! Deita-te tranquilo e descansa porque a nossa compreensão (e entusiasmo por esta tua experiência) estará sempre acima do nosso "capricho" de estar a par das tuas novidades (por mais prazeroso que seja lê-las!).

Fica bem!
Beijinhos,
Pat

Anónimo disse...

Claro que Nery chegou à area... Problemas de integração não terás e é obvio que estas numa nova etapa! Bjt daqui da terra!